Eu havia prometido contar sobre nossa viagem de canoa de volta da reserva Cazumbá-Iracema, mas antes preciso contar da nossa chegada ao Acre e a subida do rio Caeté até a reserva.
É importante salientar porque estávamos lá, ou o porquê dessa aventura que mudaria nossas vidas.
Aurelice Vasconcelos fez uma tese de doutorado junto com a comunidade da reserva Cazumbá-Iracema “As Amazônias da Cazumbá: A fotografiacomo vivência de antropologia visual e socioambiental para revelar uma reserva extrativista e sua cultura” Orientador:Prof Dr Norberto Stori, Coorientadora: Profª Drª Regina Lara Silveira Mello no programa Educação Arte e História da Cultura pela Universidade Mackenzie. Sua defesa foi no início de fevereiro. Aurelice tinha tido a ideia, maravilhosa, de levar a banca para a reserva e lá acontecer a defesa. Infelizmente isso não foi possível, mas resolveu fazer um evento com vários professores, mestres e doutores no Acre em comemoração à diversidade, à educação, à arte e a cultura.
O grupo foi composto de pessoas que vinham de várias partes do Brasil. Aurelice já estava na reserva nos esperando.
Figura 1- da esquerda para direita: Cleonice (DF), Rita (SP), Vera (DF), Luiz (RN), Rosana (DF) e Ana Carmen (SP). Nessa foto faltou o arquiteto José Luiz, companheiro de Cleonice.
Cleonice Pereira foi professora de Aurelice e é grande amiga da família. Rita Demarchi amiga e companheira de Grupo de Pesquisa Em Mediação Cultural: Provocações E Contaminações Estéticas e doutora em Educação, Arte e História da Cultura. Vera e Luiz, mãe e tio de Aurelice, Rosana, pesquisadora e arte-educadora da UNB e Ana Carmen Nogueira mestre em Educação Arte e História da Cultura e amiga de toda essa gente bonita.
Figura 2 – Mig e Renata
Mig e Renata saíram de São Paulo em outro vôo. Renata Americano é mestranda em Educação, Arte e História da Cultura na Universidade Mackenzie e companheira do grupo de pesquisa em Arte na Pedagogia do Mackenzie.
Mig é seu marido, músico e apaixonado e por árvores.
Por meio de articulações e parcerias Aurelice e a irmã Socorro de Siqueira das Irmãs Servas de Maria Reparadoura, duas guerreiras, que nos juntaram para conhecermos o Acre e fazer uma série de oficinas e palestras de formação de educadores. Essa será outra história que terei imenso prazer em contar.
Chegamos todos de madrugada em Rio Branco e Aurelice providenciou um hotel, mas não conseguiu nos encontrar na madrugada, pois chovia muito na reserva e ela não conseguiu pegar a canoa. Logo pela manhã, ela já estava lá com uma van cedida pelo Instituto Federal do Acre, campus Sena Madureira. No dia 02 de maio estava programado uma série de oficinas e palestras para os professores da rede municipal no Instituto Federal.
Figura 3 – da esquerda para a direita: Rosana, Vera, Rita, Luiz, Aurelice e Ana Carmen
Pegamos a van e Aurelice foi comprar o combustível. O motorista da van, nos deixou literalmente na beira do rio Caeté. No entanto, Aurelice ficou nos esperando do outro lado do rio onde há um “porto”. Depois de horas e muito sol na cabeça, ela conseguiu nos encontrar, o barco chegou e embarcamos.
O barco é conhecido como voadeira, que é um barco de alumínio movido a motor de popa mais rápido e é maior que uma canoa. Foi mandado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Devemos ter conseguido partir perto das 16 horas. Aqui no Acre, o mundo escurece mais cedo, o barco não tem luz e nas margens temos muitas árvores, mas nenhum poste de luz.
Foram 4 horas de viagem. A paisagem é linda, o rio não é muito largo e tem as águas barrentas. Toda margem o barro parece uma argila clara. Deu vontade de fazer um trabalho com ela. Por vezes avistávamos canoas paradas na margem do rio, o que indicava que havia algum humano por perto.
Outras vezes a voadeira diminuía o ritmo da subida para deixar uma canoa passar.
Estávamos subindo o rio, portanto, contra a correnteza por isso a viagem demora um pouco mais. A tarde foi caindo e o céu foi mostrando toda sua exuberância de cores. Muitas e muitas vezes nessa viagem me arrependi de não estar com uma máquina fotográfica potente.
Chegou a noite e veio a escuridão.
O barco não tem farol.
As lanternas estavam em algum lugar nas mochilas, que estavam em algum lugar dentro de um dos sacos pretos, que não se sabia onde estava.
Mig e Renata que estavam sentados no gargarejo do barco pegaram a lanterna do banqueiro e do celular e foram tentando guiar o caminho.
Demorou para chegarmos. Depois de um tempo parecia que tínhamos perdido o lugar de ancoragem da reserva. Aurelice e Marcelo, o barqueiro desceram em um local que havia uma canoa e subiram até a casa para perguntar onde estávamos.
Não. Não tem sinalização de onde ancorar para chegar na reserva.
Não. Não tem deck para desembarcar
Não tem seta indicando “você chegou”.
Sim. Tem estrelas.
Muitas. Como nunca tinha visto em toda a minha vida.
Soltaram todas as estrelas do universo. Estavam todas a nos observar, dando muita risada de nós.
Nós rimos com elas, por isso chegamos bem.
Aurelice e Marcelo, o barqueiro e Mig, desceram e foram até a comunidade chamar o pessoal do quadriciclo para nos ajudar. Ao sair da voadeira Aurelice disse: vocês não saiam daí. Daqui a pouco vem um pessoal buscar vocês. Um quilometro de caminhada no escuro, no barro até a comunidade. Um pouco depois, chegam nossos resgates. Eles só nos contaram no dia seguinte que tinha algumas cobras rodeando nosso barco. Chegamos todos bem no alojamento do ICMBio.
Sem luz Mas com todas as estrelas do universo rindo conosco.
Foi lindo.
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